sábado, 11 de junho de 2011

Da minha mais nova primeira vez



Hoje senti um frio estranho na barriga.
Coisa de pré-adolescente que seria normal, se eu ainda fosse um garoto de treze anos.
Hoje foi a minha primeira vez em alguma coisa, e isso me trouxe recordações das minhas outras primeiras vezes.

Esqueci de como foi a primeira vez que eu falei. Eu devo ter dito proparoxítona ou paleolítico.
Da primeira vez em que andei, ganhei uma barra de chocolate, inteirinha pra mim.
Quando eu fui à escola pela primeira vez, chorei desenfreadamente para ficar na primeira fileira, comi o lanche antes do intervalo e não quis sair quando a aula terminou.

Decidi que a minha iniciação como ciclista seria definitivamente encerrada, visto que eu não pretendia encher as minhas pernas de cicatrizes.
E não fui eu quem escolheu a cicatriz que até hoje tenho na sobrancelha, fruto da primeira vez em que fui atropelado por um fusca amarelo.

E nenhuma primeira vez foi tão terrivel quanto aquela em que eu desci a correnteza, me segurando em pedras lisas e galhos secos e, como todos estão cansados de saber, desisti de ser o Cielo da temporada.

Quando me apaixonei pela primeira vez nem sequer soube que era paixão.
E depois, quando me apaixonei de novo (e de certa forma foi uma segunda primeira vez), vivi aquilo de uma forma tão intensa que ainda hoje sinto aquela força estranha no ar...
E da primeira vez em que eu descobri quem eu realmente era foi inevitável a lágrima.

Quando estreei minha vida de viajante, fiquei encantado com a paisagem, o vento, o sol batendo à janela do carro, pedindo passagem, e a calma de esperar que o tempo passasse frouxo.

E quando morei sozinho pela primeira vez, chorei semanas inteiras com saudades da minha casa, da minha família, dos meus amigos, e do meu eu antigo.

Quando chorei pela primeira vez, doeu.
E quando perdi minhas primeiras convicções, quase não suportei.

Inaugurei sorrisos, sonhos e roupas descoladas.
Inovei cortes de cabelo, capas de caderno.
Conheci lugares, pessoas, li livros.
Tudo pela primeira vez.

Mas nunca, nunca tinha passado pelo que passei hoje.

E não doeu, não arrancou nenhum pedaço (pelo menos aparente), não ralou, não queimou, não deixou marcas.

E eu ainda não acredito que o fiz.
Nunca havia antes, pulado um muro.




sexta-feira, 10 de junho de 2011

Sobre conversas fiadas, meias furadas e trident de canela.

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Não foi de repente.
Não posso dizer que acordei diferente, que os sinos tilintaram numa noite fria e eu simplesmente mudei.
Porque não foi assim.

Foram muitos dias de monólogos febris, travesseiros apertados contra o peito e lágrimas queimando o rosto.
Foram muitos nãos espremidos entre as terças e sextas-feiras intermináveis, e muitos talvez nos fins de semana.
Foram muitos abusos, e pouco sobrou.

Não foi por acaso que criei essa casca protetora, esse ar de quem sabe tudo (embora não saiba nem o que realmente sei), essa falta de modéstia em assumir maturidade, responsabilidade, calma.
Não foram em vão as súplicas de um-pouco-mais-de-atenção-e-carinho.
E não foi em vão o adeus.
Tudo valeu a pena e serviu pra que eu me tornasse o que sou.

Não foi fácil, mas ninguém disse que seria.

Hoje é simples abrir a janela e olhar o tempo, sem esperar muito dele.
Ou ir trabalhar de chinelo de dedo pra não usar aquela meia furada que incomoda o meu dedo do meio.
Hoje é assombrosamente mais simples dizer um sonoro não quando um vulcão por dentro entra em erupção querendo um sim.
É automático.
Um dia, tudo muda.

Posso passar horas a fio jogando conversa fora, sorrindo, ou simplesmente calado.
Posso assumir de quem eu gosto, quando gosto e depois desgostar, ao meu gosto.
Posso não querer receber visitas ou convidar mil pessoas pra comer uma pizza.

"Posso brincar de descobrir desenho em nuvens, posso contar meus pesadelos e até minhas coisas fúteis..."

Posso me permitir sentir saudade de quem eu amo (ou amava e passei a desamar) e nem por isso querer estar perto.
Sentir saudades, só por sentir.
Me permitir comer besteiras e, no outro dia, me culpar pelas 300 gramas a mais na balança, comprar trident de canela e falar, sem educação nenhuma, perto de quem odeia aquele cheiro que eu adoro.

Posso dizer eu te amo, sem me importar com quem esteja ouvindo isso.

Hoje eu aprendi que posso tudo, se fizer por merecer.