sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Meu porto seguro.

À Mazé Ricarte


Fazem 21 anos, quase 22.
Eu não fazia a mínima idéia do que acontecia naquele quarto meio claro, meio escuro, com todas aquelas pessoas em volta, umas sorrindo, com a sensação de dever cumprido, outras chorando de felicidade.
Pra ser sincero, eu nem lembro que nada disso tenha ocorrido.
Mas alguém me disse que foi assim, que eu não causei muita dor e chorei imediatamente ao aparecer (há duvidas quanto a isso, talvez eu tenha chorado antes mesmo de aparecer).
Eu chorava, mesmo que sem motivos, pela primeira vez. E esse alguém estava lá.
À medida que os primeiros dias passavam, eu devorava litros de leite, segundo esse alguém. Devorava como um animal faminto e deixava-a exausta.
Dormir, é claro, era tarefa difícil para ela, já que eu sempre estava disposto a comer, e comer, e quem sabe comer mais um pouco.
E, nas noites em claro, ela estava lá.
O tempo trouxe comidas novas e eu fui enjoando do leite e me encantando por bolinhos disso, tortinhas daquilo e umas papinhas que eu nem lembro mais o gosto.
E fui fazendo-a substituir as noites em claro pelos dias cansativos, correndo de um lado pro outro atrás de uma bolinha branca e redonda (era eu) que não parava um só instante.
Eu caia demais e, pra me levantar, ela estava lá.
Eu aprendi a falar, a andar sem cair, a ler. Tudo porque ela estava lá.
E ela esteve lá quando eu não consegui aprender a andar de bicicleta, e esteve quando eu não aprendi a nadar também.
Estava sempre por perto quando eu tinha duvidas do português primário da 3ª série e parecia segurar a impaciência com toda a força que tinha, quando eu era insensato demais pra perceber os erros cometidos de novo.
Meus erros pareciam perfeitos. Pois ela sempre esteve lá.

E, como seria natural, eu fui crescendo e parando de causar aquelas velhas preocupações infantis.
Eu tinha preocupações pré-adolescentes demais para presenteá-la.
E ela teve que deixar de estar, por algum tempo, pra sanar os problemas que o destino trouxe.
E eu percebi que, mesmo distante, ela continuava estando ali.

É mágico demais pra ser entendido esse desprendimento voluntário, essa vontade de viver pro outro, essa doação inteira.
Ela sempre foi mágica pra mim.
A ausência dela me fez ver o quanto ela significava e o quanto ela e eu somos um só, como caminhamos juntos e servimos de apoio um ao outro - ela me apoia muito mais que eu a ela, claro.

E aprendi tanta coisa, que nenhuma escola ensinaria.
Aprendi, com ela, que sonhos e planos se distinguem muito.
Através das experiências dela, eu sei que a vida não reserva contos de Alice no país das maravilhas, mas que eu posso escrever minha própria estória, e sonhar meus sonhos, e construir meus planos.
Aprendi graças a essa pessoa iluminada e maravilhosa, que mesmo que se esteja limpando vidraças, se eu limpar muito bem essas vidraças, amanhã poderei liderar uma equipe.
Aprendi a vencer e a perder, com ela.
Aprendi a amar.

E pode ser que eu não seja grande pessoa e que não tenha as qualidades maiores do mundo.
Pode ser que eu tenha os piores defeitos do mundo.
Mas eu estou certo de que o melhor que há em mim, foi ela que construiu.
O amor ao ser humano, a dignidade e a imortal esperança.

E a cada dia, eu quero viver o suficiente para fazer por ela, tudo o que ela fez, e faz, por mim.
Porque ela é meu ponto de chegada, meu porto seguro.
E eu a amo, com tudo o que posso.
Minha amiga, companheira.
Minha mãe.





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