segunda-feira, 9 de maio de 2011

A arte de entender o que não se explica.



Certa vez, um homem jovem com uma criança no colo viajava ao meu lado.
Ele, o homem, aparentava não mais que trinta anos.
O outro, menino, não podia ter mais que quatro.
Seguíamos o trajeto calados, sérios.
Eu, lendo o meu Comer rezar amar, eles, dividindo uma cumplicidade monstruosa, trocando carinhos de pai e filho.
O tempo passava muito melhor pra ambos que pra mim.

Comecei, com um tempo, a perceber que o menino, a cada parada que o ônibus fazia pra embarque/desembarque/abastecimento, perguntava insistentemente se já tínhamos chegado à Acopiara (penúltima cidade antes do destino final).
De início achei uma chatice aquela criança perturbando o seu pobre pai que tentava dormir (e me fazendo perder a concentração no livro), sempre com a mesma frase: "É Acopiara, pai?" e a resposta sempre vinha com a mesma doçura: "Não, meu amor, ainda não"...
Depois, descobri que eles estavam indo encontrar a esposa/mãe, e então entendi a angústia e ansiedade pela chegada à tal cidadezinha.

Parada pro almoço:

"Pai, já é Acopiara?"
"Não, meu amor..."

Segunda cidade do roteiro:

"Pai, já é Acopiara?"
"Não, meu amor..."

Próxima (e próxima, e próxima):

"Pai, já é Acopiara?"
"Não, meu amor..."

Todos por perto já estavam rezando desesperadamente pra que chegasse logo o destino daquela aflita criança, que ela pudesse encontrar sua mãe e receber dela todo o carinho, tomar seu sorvete de cidade do interior, correr nas pracinhas de cidade do interior, ficar irritado com os infinitos apertos nas bochechas, vindos das amigas da sua avó, na cidade do interior.

E, enfim, aproximava-se.
O pai disse com um ar desinteressado: "Estamos chegando em Acopiara, macho."
E o menino sorria eufórico, pulando no colo do pai como quem queria pular a janela ali mesmo e abraçar aquele povo, e correr naquelas ruas, e agarrar qualquer pedaço do que fosse Acopiara.

E Acopiara chegou.
E eu esperei que eles seriam os primeiros a desembarcar, mas a velhinha da cadeira da frente desceu, os caras lá do fundo também.
A mulher antipática apressou-se.
O ônibus tornou a dar a marcha-ré e eles não desceram em Acopiara.

No resto do trajeto, o pai dormiu e o menino não perguntou mais nada.
Enquanto eu me perguntava porque eles não haviam descido e encontrado toda aquela felicidade e aconchego acopiarenses.
Chegamos no destino final.
E aí me veio a resposta do que me martelava a cabeça nos ultimos 50 minutos de viagem.
Lá, na rodoviária de Iguatu, estavam a mãe e a avó do menino, à sua espera.
E ele desceu correndo, rodopiando, gritando.
E foi abraçado, beijado, suspenso no ar.

E cheguei à minha conclusão: o frio na barriga do "estamos quase" é infinitamente melhor do que uma chegada sem espera.
O que faz de um encontro especial é a ansiedade incontida de que ele aconteça.
Iguatu era o sinal de que já haviamos chegado.
Acopiara era a imensa sensação de que faltava pouco.



2 comentários:

Alex Monteiro disse...

Seu blog é muito interessante
PARABÉNS
^^http://cantinhocomtudo.blogspot.com/

Lucyano Jorge disse...

Belo blog.

http://cinemaparceirodaeducacao.blogspot.com/